terça-feira, 5 de agosto de 2014

A sangria das novelas e a segmentação do público de Chiquititas – Parte 1

As novelas nunca tiveram um patamar tão desolador como atualmente. “Em Família” e “Meu Pedacinho de Chão”, tramas da Globo, chegaram ao fim com os piores índices do horário em décadas. “Geração Brasil” não empolga a audiência. “Império” já tá no patamar da antecessora. “O Rebu” não lembra o sucesso de “O Astro”. “Vitória” patina na medição do Ibope. E “Chiquititas” é a única que se apresenta dentro da imaginária meta, mesmo no ar há mais de um ano. Os motivos podem ser vários, os mais diferentes possíveis: a fórmula se esgotou após 51 anos de novelas diárias; os autores repetem histórias só mudando os cenários; atores emendam vários trabalhos sem dar descanso ao público; o telespectador está mais interessado em outro tipo de entretenimento e, diante disso, busca a TV a cabo ou a Internet; e há muitas novelas no ar.
Sobre o último argumento, vamos aos números. A Globo produz atualmente cinco novelas e reprisa uma. O SBT produz uma, mas reprisa quatro. A Record só exibe uma. O Viva reapresenta quatro. Só aí são 15 novelas. As reprisadas já foram ao ar, em sua maioria, mais de uma vez. Olhando para o início dos anos 2000, as novelas da Globo foram as que mais perderam. O SBT após uma fase dourada, despencou e reagiu apenas com ‘remakes’ infantis que lembram nada os originais mexicanos/argentinos. A Record também teve um salto, mas vive em má fase desde 2012. Mesmo com a hipótese do telespectador procurar outros canais e, com isso, outras opções de diversão, chama atenção o fato de assuntos relacionados à TV aberta (e às novelas) dominarem o ‘trending topics’ do Twitter.
A segmentação do público é, possivelmente, a explicação mais plausível. Antes disso é preciso dizer que era necessário não só mais um instituto de audiência, como também de um aumento no número de aparelhos do Ibope. Juntamente com novas tecnologias que substituam o ‘people meter’ (aparelho que mede a audiência da TV e é quase uma lenda urbana televisiva). A segmentação do público explica o sucesso (nos números) de “Chiquititas”. Seu público alvo e assistente (afinal, audiência foi termo criado no rádio) é desprovido de qualquer visão crítica no que diz respeito a enredo, história, direção, elenco e todos os demais elementos de uma novela. Não tem discernimento para isso.
O público de “Chiquititas” recebe qualquer cena que lhe é dada sem qualquer reação contrária. Os signos de “Chiquititas” são os mais pobres possíveis, onde fantasias, ilusões e utopias ocupam o lugar de temas delicados ou que provoquem algum incômodo no telespectador. Não se espera, claro, que uma novela infantiloide discuta o neonazismo e nem o homossexualismo. Porém mostra sua profundidade rasa por completa ao ignorar temas importantes na educação de uma criança. É só ver que no original, “Chiquititas” bebia na mesma fonte das novelas adultas, mas aliviava alguns assuntos sem deixar de colocá-los no vídeo.
Se no original brasileiro de “Chiquititas” havia desde acidentes de carro fatais a vilãs mirins capazes de provocar uma cegueira na rival, passando por padrastados violentos, o ‘remake’ opta por um universo à parte. O público alvo é infantil, mas acaba atingindo também o público infantiloide, que opta por fugir de problemas por alguns minutos ou que prefere se imaginar no lugar daqueles que no vídeo estão como uma espécie de válvula de escape ou busca pela perdida infância.
segue amanhã.

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